terça-feira, 8 de março de 2011

Roupa de domingo


Roupa de domingo







Ana Echevenguá e Renata Kowalski*



“Todas já tinham aceito três ou quatro desses convites, até entenderem que aquilo levava a lugar nenhum além da cama de um homem normalmente mais velho, poderoso, mas interessado apenas na conquista. E geralmente casado, como todo homem interessante.”extraído do livro ‘O vencedor está só’ de Paulo Coelho.





Quantas mulheres de diferentes idades já foram conquistadas por aquele príncipe do emprego, do bar, do shopping, que a encantou com um belo sorriso e um blusãozinho sobre os ombros? Aquele homem simpático e educado que te pergunta, a cada atitude tomada por ele, se pode fumar, se pode levantar o vidro do carro e se pode lhe oferecer uma bebida...

Repentinamente, pára tudo! Você deixa de ser “a especial” e se torna “a descartável”.

Aonde fabricam esses homens que, quando cai a máscara de “homem simpatia que achou a mulher especial”, tratam as mulheres como objeto ou um pedaço de carne? para eles somos peitos e bundas, loiras burras, gostosas, comíveis...

Não queremos ser tratadas como as últimas das virgens, como peças em extinção. Afinal gostamos de sexo, sentimos atração física, temos tesão... Mas, às vezes, incomoda-nos que a aproximação inicial do sexo oposto, com toda aquela bajulação, venha acompanhada da tentativa de uma “possível transa”.

E se a presa feminina cede aos caprichos do “senhor príncipe”, ele muda as suas atitudes. Os mails não terminam mais com beijos, terminam com abraço; o restaurante com vinho torna-se uma coca-cola no bar do Zé. E a conversa, num encontro imprevisto, limita-se ao 'oi' e 'tchau, tenho um compromisso agora'.

Enfim, de amiga-luxo a amiga-lixo, descartável. É assim que nos sentimos quando ele despe a roupa de domingo, o charme e o sorriso e se transforma num amigo indiferente à nossa companhia. Por mais que você se esforce, seja simpática, demonstre interesse até pelo time de futebol dele, ele já está convicto do que pensa a seu respeito. Zona de amizade não rola flerte.

Foi a mulher que mudou? Não! Ela foi deletada. E ele precisa seduzir outras donzelas mais fáceis de serem conduzidas e manobradas, e que não o estressam tanto com questões existenciais, com papos sobre a economia global, com planos para o futuro...

Não reclamamos da mudança de hábitos e atitudes na relação tórrida que terminou antes de começar. Reclamamos do teatro aonde um jantar caro e um belo cortejo devem ser pagos com uma trepada: entre quatro paredes ou no banco trazeiro do carro. E todos aqueles elogios - você é incrível, simpática, atraente, culta... - terminam após a ejaculação (muitas vezes precoce).

Nem todos os homens são adeptos deste imediatismo; mas é triste saber que essa atitude não se encontra apenas nos jovens adultos. Também agem assim os homens ditos "maduros", grisalhos e responsáveis. Assim como os jovens, eles vestem a roupa de domingo e saem à procura de alguém pra "ficar".

Com os adolescentes a gente já sabe que os beijos e os amassos terminarão no final da festa. Mas quando recebemos um elogio de um adulto, com flores e galanteios, acreditamos na sua sinceridade; não entendemos como algo que terminará junto com a noite.

É triste que muitos homens brinquem com gestos que representam o afeto e o romantismo. Gestos que toda mulher gostaria de guardar nos arquivos da memória e repassar às gerações seguintes. Estão usando o sinal das flores e do jantar à luz de velas - sinais universais de gentilezas e de reconhecimento masculino pela mulher - como moeda de troca por uma noite de sexo.

É! O “ficar” do pessoal adulto vem travestido com roupa de domingo, charme e convites para jantar e ir ao cinema. Virou moda! Será que acabou a sinceridade e o romantismo do buquê de flores?



* - fundadoras do Movimento Feminíssimo God Saves the Flying Shoes